Quarto site mais acessado do mundo, a enciclopédia online em que qualquer pessoa pode editar os verbetes tem muito a ensinar às empresas que querem entrar na era da colaboração
Por Época Negócios
Wikipédia vem da expressão havaiana wikiwiki, que significa rápido. E rapidez é mesmo a sua marca. Às 23h03 de 4 de novembro (2h03, no horário de Brasília), por exemplo, o verbete sobre as eleições americanas já registrava a vitória de Barack Obama. Essa agilidade, associada à vasta gama de assuntos tratados, transformou a Wikipédia, de um projeto de enciclopédia online em inglês escrita e editada pelos próprios leitores, em um fenômeno global.
Em oito anos, virou o quarto site mais visitado do mundo, com 300 milhões de páginas vistas por dia.
Existem wikipédias em 253 línguas e a maior é no idioma inglês, com 2,6 milhões de verbetes.
Mas por trás dessa grande operação há uma organização enxuta, num modelo de negócios inusitado. Com 22 funcionários, a Wikipédia conta com milhares de editores voluntários. Gasta por ano US$ 4,6 milhões, dinheiro obtido com doações que vão de poucos dólares a cheques de cinco dígitos. No início de novembro, a Wikimedia, fundação responsável pela enciclopédia, lançou uma campanha para arrecadar US$ 6 milhões e conseguiu quase a metade em dez dias. O segredo? A chance de fazer parte da missão de tornar o conhecimento acessível a qualquer um – e de forma gratuita.
“Há dois jeitos de engajar as pessoas mais inteligentes do planeta: contratá-las ou inspirá-las”, disse Jimmy Wales, fundador da Wikipédia, em entrevista a Época NEGÓCIOS.
Não que Wales tivesse outra opção quando lançou a enciclopédia, em 2001. O mundo pontocom vivia a ressaca do estouro da bolha. O futuro da rede estava em suspenso e não havia dinheiro para investimentos. Restou a Wales criar um modelo inédito, com raízes fincadas na colaboração. “Se tivéssemos dinheiro, teríamos contratado gente para gerir o site e perdido a sua real inovação: ser completamente administrado por quem o usa.” Wales enxerga a crise financeira mundial como uma oportunidade: “A crise nos força a ser mais criativos. Dinheiro e inovação não casam muito bem”.
Em sua curta existência, a Wikipédia sobreviveu a críticas de que não é confiável, por causa de erros e do uso promocional de verbetes, e virou de ponta-cabeça o conceito de que conhecimento de qualidade só é produzido por especialistas. Transformou-se num marco da internet colaborativa, a web 2.0. Esse espírito se espalhou por toda a rede em sites como o Digg, que permite a classificação das notícias pelos leitores, e o YouTube, de vídeo amadores. Também começa a influenciar empresas que querem interagir de forma digital – e mais eficiente – com seus clientes.
Wales cita o exemplo da Hewlett-Packard. Ele criou para a HP uma wikipédia para o lançamento de um computador destinado a games. Usando o conceito de wiki, ferramenta de internet que permite a várias pessoas construir documentos em conjunto, a HP conseguiu descobrir o que os consumidores esperam de um computador para games, para poder aperfeiçoá-lo. Na visão de Wales, esse modelo será cada vez mais usado pelas empresas. “Ainda vai haver muitos anúncios de TV, mas o que as empresas querem é conquistar aqueles que influenciam outras pessoas”, diz Wales. “O iPod não é um sucesso por causa da propaganda, mas porque gente que influencia o achou legal.” Companhias como a IBM e a Intel também viram vantagens no conceito de wiki e resolveram criar as próprias enciclopédias digitais. “Em vez de memorandos ou reuniões, a empresa cria um lugar onde as pessoas podem falar umas com as outras livremente, inteirar-se do que acontece e inovar”, afirma Wales.
Mas a maioria das corporações está ainda distante desse tipo de colaboração. Segundo Wales, o que mais se vê são ambientes competitivos, em que vencem aqueles que detêm as informações. Acabar com isso vai além de fazer um wiki. Requer criar uma cultura que incentive a troca de conhecimento. “Isso precisa vir dos líderes, mas muitos gostam dessa animosidade entre equipes. Esquecem que, assim, o objetivo é derrotar umas às outras, e não inovar”, afirmou. E quem não mudar, Wales? “Virará dinossauro.”
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